O homem é o único animal dotado de liberdade. É mais escancarada a sua capacidade de escolher do que o uso que faz da razão. Pois suas escolhas nem sempre são racionais. Os outros animais agem por instinto. Um formigueiro é o mesmo, seja nos primórdios da criação, seja em nossos dias. Será sempre igual. Já o ser humano surpreende. Nem sempre para melhor.
A sapiência romana, cuja estrutura habita nosso ordenamento jurídico, já detectara essa fragilidade: optima video, deteriora sequor. O homem possui condições de saber o que é o melhor, mas sua vontade não raro segue o pior.
É o que acontece quando a razão recomendaria prudência, sensatez, tolerância e boa-fé. Ele prefere a imprudência, a insensatez, a intolerância e a má-fé. O presente momento brasileiro é uma daquelas fases emblemáticas em que a Nação precisa de tranquilidade, compreensão e espírito de sacrifício. Mas o time do “quanto pior melhor” agita, estimula e, inconsequentemente, parte para confrontos, violência física e verbal, irresponsabilidade sem limites.
O ser humano é suficientemente livre para abraçar o bem e até morrer por ele. Mas a sua liberdade encerra a nefasta possibilidade de optar pelo mal. Sua humanidade reside na sua liberdade, na sua indefinição, na capacidade de se desprender de qualquer código. Por isso é que os bons conselhos não surtem efeito, quando há predisposição para trilhar o caminho do perigo.
A riqueza e a miséria do humano estão na sua liberdade plena: a possibilidade de escapar do certo, do recomendável, do elogiável e mergulhar no incerto, no indefensável e no reprovável. A tragédia é que as consequências desses passos errôneos recairão sobre inocentes. Não se atua sem resultados no mundo fenomênico. A avaliação dos frutos de uma opção deveria passar pela consciência que ainda não perdeu o rumo. O consequencialismo é um compromisso da lucidez em relação ao futuro, indissoluvelmente condicionado ao presente.
A liberdade é uma poção mágica, a ser consumida com bula que advirta ao usuário: use com cuidado! Mas quem é que lê a bula antes de se servir da liberdade?
Fonte: Jornal de Jundiaí | Data: 10/04/2016
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo. E-mail:imprensanalini@gmail.com.