O recente frege sobre biografias não previamente autorizadas, envolvendo os ídolos da minha juventude – hoje caras caricaturas de si mesmos – me forçou um retrospecto…
Detentores de fama e riqueza adquiridas – por superexposição oportunista – em dias de censura de que se dizem vítimas, alguns artistas brasileiros fundaram o grupo Procure Saber, no qual defendem a proibição de suas biografias sem prévia aprovação, apelando ao direito à privacidade.
De tal grupo de extermínio de biógrafos fazem parte o rei da Jovem Guarda Roberto Carlos, Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outras estrelas somenos.
Roberto Carlos, o eterno rei da juventude, seria mais desconhecido que Cachoeiro do Itapemirim se não fosse o Splish Splash da versão xexelenta tirada do original não menos mixuruca americano, composta e gravada por Bobby Darin em 1958.
Alcançou a realeza – e o milhão de amigos – fazendo a mesma coisa com o Calhambeque e o Lobo Mau, versões pueris de Road Hog, de John Loudermilk, e The Wanderer, de Ernie Maresca, grande sucesso do cantor Dion, num tempo em que, aparentemente, autorização só existia do pai para o filho que quisesse se emancipar.
Chico Buarque era mais autêntico quando confessava que estava tão à toa na vida que era preciso alguém chamar pra que visse a banda passar – enquanto a maioria dos jovens do seu tempo pensava naqueles subempregos que iriam sustentar os estudos e a entrada na faculdade – do que quando, celebridade, cantava Cálice ou Apesar de Você.
Caetano Veloso também soava – ou zoava! – mais sincero quando alegremente revelava ao público que andava sob o sol sem lenço e sem documento, e que nunca mais foi à escola, do que quando proibia, cheio de caracóis e de dinheiro, qualquer proibição, já como senhor daTropicália.
Já Gilberto Gil, grande adepto do cargo público – profissão que harmoniza melhor com a carreira instável de músico – era mais popular quando mandava aquele abraço de Londres do que cantando Cálice com o Chico ou Refazenda, em terras tupiniquins.
Naqueles idílicos dias da juventude, de menor permissibilidade, nos permitíamos ao luxo de dar a nossa contribuição à formação dessas criaturas censoras de agora:
Assistíamos aos shows, alguém do grupo de amigos comprava o Long Play, outros compravam as fitas cassette na Galeria Pagé, um terceiro gravava, e todos tínhamos o que ouvir no toca-fitas do Fusca financiado mediante autorização do SPC, que Brasília era pra poucos…
Sem desmerecer o talento, o autor faz a obra; e a circunstância constrói a celebridade, personagem que transcende pela graça dos sensos do admirador, também susceptível ao ambiente no tempo.
E não deixa de ser frustrante ver humanidade e paradoxo nos super-homens que criamos a bel-prazer: o lado mortal dos nossos ídolos mostrando que não há força – e nem farsa! – que dure pra sempre…