Deus é católico?

A coragem do papa Francisco é louvável. Não é preciso ser católico para reconhecer que ele é um divisor de águas na Cristandade. Após reconhecer que a Corte Pontifícia é “a lepra do Papado”, ele afirmou que não há um “Deus católico”, mas um Deus. Para todas as pessoas, não apenas para os que foram batizados na Igreja Romana.

Assim como Francisco de Assis foi um revolucionário, o papa Francisco exerce a sua liderança para reverter os rumos de uma Igreja que se tornou uma enorme estrutura à qual nem sempre comparecem o amor, a compaixão, a compreensão, a tolerância e o respeito à dignidade humana. As pessoas continuam a ser os mesmos seres incompletos, fragílimos e efêmeros. Não querem se compenetrar de que há um único encontro certo e definitivo: o encontro com a morte.

Na vã ilusão de que viverão eternamente, apegam-se à matéria e vivem da aparência. Cada um mais egoísta do que o outro. O outro, por sinal, é problema “exclusivamente seu”. Não me diz respeito. O papa Francisco enxerga longe e detecta o que corrói a substância de uma Igreja que tem de ser o refúgio de todos os infelizes. A Igreja precisa acolher. Ninguém hoje aceita discurso sem ação. O exemplo é o único ensinamento eficiente.

Quando o ateu vê uma Igreja que pensa mais nela mesma e em suas estruturas temporais, tem todos os motivos para se afastar dela. Por isso é que a fala papal tem repercussão fora do Vaticano. Quem não concorda com a era narcisista em que vivemos e que o Papa Francisco censurou? Ele sequer gosta da palavra “narcisismo”. Pois ela “indica um amor fora de lugar por si mesmo. O verdadeiro problema é que os mais afetados por isso, que na realidade é uma espécie de desordem mental, são pessoas que têm muito poder.

Muitas vezes, os chefes são narcisistas”. Isso vale para todas as organizações humanas. O personalismo prepondera, a busca de mais poder é constante, o desprezo pelos demais um signo que já nem incomoda, pois se incorporou à vivência de qualquer exercício de autoridade. Deus é amor e este é o único motor suficientemente capaz de conferir um rumo de salvação ao combalido, sofrido e sinistro Planeta que estamos a destruir. De dentro para fora. Prestem atenção: primeiro destruímos nossa moral, depois a própria Terra.