O Ermirio que conheci

Qual seria a chance de um humilde juiz conhecer Antonio Ermirio de Moraes, um dos homens mais poderosos do mundo? Praticamente nenhuma, não fora um fator providencial. Fui acolhido como integrante da gloriosa Academia Paulista De Letras. Sem méritos, é verdade. Mas isso me permitiu conviver com Miguel Reale, Lygia Fagundes Telles, Paulo Bomfim e Antonio Ermirio de Moraes. Entre muitos outros.

Quando assumi a Presidência da APL, o teto caiu. Não em sentido figurado. Ruiu mesmo, resultado de infiltração no velho edifício do Largo do Arouche. Assim que a notícia chegou, Antonio Ermirio me telefonou e marcou um encontro lá mesmo na Academia. Segurou-me pelo braço – essa uma das suas características afetuosas: tocava as pessoas com as quais falava – e disse: – “Presidente: mande consertar e não se preocupe com dinheiro!”.

Era um homem generoso. Já havia custeado a informatização da Biblioteca. Estava sempre disponível a quem o procurasse. Trabalhava de fato na Beneficência Portuguesa, que visitava todos os dias. Na sua grandiosidade, era simples e bom. Caminhava a pé do C‘a D‘Oro, onde almoçava, até à sede da Votorantim atrás do Teatro Municipal.

Num desses percursos, foi ameaçado por um trombadão, que indagou se ele era Antonio Ermirio. Teve o tirocínio de responder: “Você acha que se eu fosse ele andaria a pé, sem segurança, com esta roupa?” (colarinhos nem sempre em ordem, paletó amarfanhado…). Apaixonado pelo Brasil, fez tudo o que foi possível para melhorar a vida dos brasileiros.

Escreveu peças de teatro com temas fundamentais. Estive na estreia de uma delas, sobre educação, cuja protagonista principal foi Arlete Sales. Não se vangloriava de seu êxito. Amou o trabalho, mas também amou a Academia. Quando a frequentava, era gentil para com todos. Participava dos debates.

Sugeria, propunha, comportava-se com elevado espírito acadêmico. Uma das últimas vezes em que pude conversar com ele foi em seu aniversário de 80 anos. Depois disso, perdeu dois filhos. A dor profunda causada pela inversão da ordem natural das coisas venceu o homem aparentemente invencível. Mas já havia conquistado o seu lugar de glória na História do Brasil e o espaço intocável que mereceu no coração dos amigos.