Sábado (19) tivemos a Marcha [pela legalização] da Maconha em São Paulo, que reuniu 1.700 pessoas aproximadamente, segundo a Polícia Militar, que seguiu da Avenida Paulista à Praça da República. Outras manifestações semelhantes estão marcadas para várias cidades do Brasil.
Não diria que é apenas um tema polêmico, mais que isso, é um tema oportuno em duplo sentido, tanto no sentido do oportunismo de interesses eleitoreiros, de contestadores profissionais, socapa da necessidade de transgressão juvenil, como também, oportuno para uma abordagem séria, sem preconceitos e ao nível da realidade científica e social atuais.
A legalização da maconha já se caracterizou como um dos poucos álibis que sobraram para a natural e compreensível necessidade de transgressão dos jovens, após os fracassos dos regimes de esquerda no mundo. Somam-se ainda a esses os insatisfeitos, pelos mais diversos motivos, profissionais, financeiros, familiares ou consigo mesmos.
A maconha possui dois componentes químicos, o tetraidrocanabinol (THC) que exacerba os processos cerebrais, podendo levar a alucinações e delírios, e psicoses em pessoas saudáveis, como também piorar os sintomas em portadores de psicopatologias, tais como a esquizofrenia. O segundo componente, o canabidiol (CBD), teria um efeito antagônico ao primeiro, de acordo com estudos recentes (LiveScience).
Particularmente o THC promove o bloqueio do sistema emocional e afetivo, o que levaria algumas pessoas às sensações de indiferença e tranquilidade perante fatos que os afligem na vida consciente.
Mas esses sintomas e fenômenos psíquicos o álcool principalmente e em menor escala o tabagismo, também propiciam. É um questionamento lógico e correto, que em meus 30 anos não só como cardiologista e também na clínica médica, fizeram-me testemunha ocular.
Destarte, não podemos tratar um assunto de tamanha importância social com um raciocínio pueril. As desgraças sociais do alcoolismo e as pessoais do tabagismo, frutos do uso consagrado dessas drogas pela tradição, numa época de total ignorância científica em relação aos seus efeitos deletérios, não é justificativa convincente para que acrescentemos à lista dos fornecedores de desgraças sociais mais um, depois outro, etc.
Sabemos que o uso e a dependência de drogas se instalam de forma efetiva em pessoas geneticamente predeterminadas, o que não significa uma questão de tudo ou nada, ou seja, há uma graduação nessa tendência, e aí o ambiente e os hábitos possuem um papel fundamental, reforçando ou inibindo.
De outra forma, há em algumas pessoas a determinação genética, que pode ser mais ou menos intensa, mas também existem os genes facilitadores e inibidores, que agirão sobre os genes determinantes. Essa atuação, ou o resultado dela, dependerá das condições ambientais e dos hábitos individuais.
Outra questão é que a legalização da maconha seria mais uma porta de entrada (e que porta!) para a disseminação do narcotráfico e suas consequências devastadoras para a sociedade, o que dispensa maiores considerações.
As justificativas de algumas pessoas que utilizam a maconha e se vangloriam de não terem despencado no uso de drogas como cocaína, crack, heroína, etc. são hilárias perante a realidade dos fatos, e as estatísticas de órgãos confiáveis internacionais.
No processo de evolução da nossa espécie, desenvolvemos mecanismos para frearem instintos e comportamentos, pois o excesso poderá ser prejudicial; assim como os centros da saciedade para a fome e sede que são mecanismos adequados, e até para instintos mais fortes como o sexo. Porém, quando se trata de uma fonte de prazer “nova”, podemos dizer de maneira simplista, que nosso organismo ainda não teve tempo para desenvolver o centro de saciedade específico.
Enfim, tudo que nos causa prazer queremos mais. Esse dado foi há muito tempo demonstrado no experimento do ratinho. Quando se ligam alguns eletrodos no cérebro de um rato, especificamente em áreas do prazer, e quando ele aperta um dispositivo e recebe uma pequena descarga elétrica, que lhe proporciona orgasmo, invariavelmente todos vão apertar o tal dispositivo até a exaustão e morte. Por quê? Pelo mesmo motivo que mencionamos anteriormente, pois não possuem um centro de saciedade específico para essa nova emoção ou prazer.
A essa altura alguém poderia argumentar: então vamos deixar que a Seleção Natural se encarregue de ajustar as coisas. É uma atitude muito descomprometida e irresponsável, pois no transcorrer do processo quem pagará a fatura?
Inconcebível que uma espécie que possui o lobo pré-frontal mais desenvolvido, bem como as camadas do neocórtex, se abstenha de usá-los só nesse caso específico, ao contrário de todo o desenvolvimento técnico-científico que nos proporcionaram até hoje, dos quais usufruímos e a vida na comunidade mundial depende atualmente.
Se quiséssemos manter um raciocínio lógico em nome do bem social, liberdades e direitos, sem cair perante o contraditório na falácia de dois pesos e duas medidas, muito mais coerente seria a promoção da Marcha pela regulamentação mais rígida e progressiva do álcool e do tabaco, o que já vem acontecendo no Brasil.