Na peça teatral “A Vida de Galileu”, escrita por Bertold Brecht em 1939, durante seu exílio na Dinamarca, há frases muito atuais e que nos fazem pensar sobre o verdadeiro papel da ciência.
Em sua obra “Discursos sobre Duas Novas Ciências”, pretendeu libertar a sociedade do jugo do preconceito e da tirania ideológica. A receita: recobrar valores fundamentais como imparcialidade, autonomia, neutralidade e coragem.
A segunda nova ciência tem uma finalidade humanística e transformadora. Daí as frases utilizadas por Brecht no teatro: “A miséria de muitos é velha como as montanhas, e, segundo os púlpitos e as cátedras, ela é indestrutível, como as montanhas”.
Houve tempo em que se pretendia manter a pobreza conformada, mediante estrita interpretação de textos bíblicos. Sempre haverá pobres. Mas essa hermenêutica não prevaleceu. Predomina a concepção de que “o céu pode começar na Terra”.
Se for possível reduzir a miséria, é dever do cristão contribuir para isso.
A opção preferencial pelos pobres foi a resposta a essa tendência reducionista de manter a pobreza aquietada, à espera de que seu sofrimento edifique palácios na eternidade.
A frase de Galileu, lida por Brecht, admitiria outras versões. Até porque as montanhas já não são indestrutíveis.
Quantas delas não desapareceram, resultado da ação humana – quase sempre criminosa – em busca de lucro crescente, na especulação imobiliária que não respeita a natureza?
Mas há duas outras frases na mesma peça que nos induzem a refletir sobre nossa atuação neste turbulento início de novo século e novo milênio da Cristandade.
Uma delas diz: “Seremos ainda cientistas se nos desligarmos da multidão?”.
A ciência não pode ser neutra. Ela existe para facilitar a vida dos homens. Não se discute aqui se tudo o que é possível em termos científicos é também ético.
Mas o progresso das ciências e do conhecimento deve produzir o bem-estar da humanidade. E isso Galileu já identificara. A derradeira frase é: “Eu sustento que a única finalidade da ciência seja aliviar a canseira da existência humana”.
Quem pode duvidar do acerto de seu asserto?
Fonte: Jornal de Jundiaí | Data: 21/02/2016
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo. E-mail:imprensanalini@gmail.com.