Peças e retalhos

A experiência correcional surpreende pela heterogeneidade de fatos, circunstâncias e eventos propiciados. A visita às comarcas do interior reserva surpresas agradáveis, como o reencontro com o desembargador Edmeu Carmesini, que depois de exercer uma judicatura notável, retornou para sua Dois Córregos onde atua como dínamo de aperfeiçoamento do convívio.

Além de se envolver diretamente na correção de rumos de certas condutas que, lamentavelmente, se disseminam por todo o Brasil, devotou-se a registrar deliciosas vivências num livro de contos. Exatamente com o título desta crônica. A Magistratura e o contato com a terra geraram excelente obra, que propicia o traçado de um novo perfil de seu respeitadíssimo autor. É cultor de uma linguagem sedutora, cada relato reserva dose substanciosa de prazer ao leitor.

Todas as páginas oferecem agradável surpresa. Impressionei-me pela semelhança que supera a analogia para encontrar pontos de incrível identidade, com o conto que encerra o volume: “Prosa de Carcamanos”. Desde a origem vêneta, à experiência na Colônia Italiana, pretensiosamente chamada em nossa cidade “Núcleo Colonial Italiano Barão de Jundiaí”, até à exploração dos braços e suor dos imigrantes pela decadente e parasitária nobreza local, tudo me fez lembrar meus ancestrais. Revi a trajetória de meu nono, Jacintho Nalini, que saiu jovem de sua “Isola Della Scala”, província de Verona e nunca mais voltou à sua origem.

Mas há contos ecológicos, a me sensibilizarem como “A Mata” e outros capazes de me emocionarem como “Natal Temporão”. Humor saudável, como “Vidas Paralelas” e “Jacaré e Lagartixa” entre outros originalíssimos, como “Memórias Póstumas de um Boi”, evidenciam cuidar-se de um autor que tem de ser descoberto e reverenciado.

O conto é uma arte mágica. Não é preciso exaurir-se em infinitas linhas para transmitir emoções e sentimentos – não confundam as figuras, lembra António Damásio, a quem há pouco ouvi no projeto “Fronteiras do Pensamento”. Edmeu Carmesini é um contista maior. Precisa perseverar e nos presentear com a continuidade no exercício profícuo dessa invenção e memória, mosaico exuberante de sua bilionária vida interior.