A idolatria da liberdade, ou liberalidade, junto com a inseminação artificial da democracia foi um fenômeno mundial, que começou da metade para o final da guerra fria, e os Estados Unidos não tiveram escrúpulos na exportação subvencionada desse produto para o mundo, com a certeza que enfraqueceriam os países da cortina de ferro, basicamente a União Soviética, o que até certo ponto funcionou.
A mídia mundial entrou em peso na cruzada da democracia e liberdade, e isso teve um efeito marcante principalmente na América Latina.
A época era extremamente propícia, após o imbróglio das ditaduras das bananas; uma virada de jogo radical era tudo o que o povo queria. O discurso foi o mesmo nos quatro cantos do continente: mudança radical, liberdade e democracia.
“Para obter-se água encanada, não basta enfiar uma torneira na parede” – é necessário o encanamento hidráulico na casa e uma rede de saneamento básico na cidade. Sem a educação do povo a um nível adequado, muitas mudanças sociais obtém o mesmo sucesso da torneira.
Como o cientista americano Stephen Jay Gould preconizava, a evolução se dá aos saltos e no campo social não é diferente, porém, toda mudança radical tem seu preço e mais cedo ou mais tarde a fatura chega.
Foi o que aconteceu na América Latina e particularmente no Brasil. Sem uma base cultural na maior parte da população, o estandarte do democratismo (e não a democracia) passou por todas as fases naturais e esperadas de sua evolução: demagogia, populismo e corrupção. Círculo vicioso, onde falta cultura imperam os maus dirigentes, pois não há consciência crítica para detectá-los previamente. Democratizou-se a impunidade política!
Quem em sã consciência poderia ser contra a máxima: “igualdade para todos”. E daí, o voto do analfabeto? E por que não o voto distrital? Será que é mais fácil dividir o Brasil geograficamente, e não os brasileiros? Mas o governo democrático não tem que representar o povo? Não entendo. Voto obrigatório? – ou seja, queira ou não você é obrigado a votar! Mas não vivemos numa democracia? Não entendo. Talvez isso seja uma “democratura”.
Na justiça comum estamos cansados de ver condenações de pequenos crimes só com base no animus, ou seja, na intenção, muitas vezes sem provas objetivas.
Por outro lado nos escândalos, mais conhecidos por CPIs, tais como, Os Anões do Orçamento, Mensalão, Correios, etc., jamais o animus ou o animus violandi (intenção de violar) animou os congressistas a condenar realmente os culpados, favorecendo manobras já conhecidas como a “renúncia profilática”, para se evitar a inelegibilidade, pequenas condenações inócuas, ou então aglutinando a revolta nacional em algum bode, como o Sr. Marcos Valério, que continua espiando a corrupção passar.
Quer dizer então que todo político brasileiro é corrupto? Jamais, muito pelo contrário, meu pai foi político, e temos hoje no Congresso Nacional um grande número de cidadãos que lutam para mudar a tendência da história atual do Brasil, que não têm medo de expor suas dignidades e serem tachados com a mesma pecha da maioria, e procuram honrar a esperança que lhes foi depositada pelos eleitores. Mas não conseguem impedir a força das águas poluídas, não aparecem para o povo, e na maior parte das vezes desaparecem na correnteza maior.
Só um exemplo, e muito atual, a presidenta Dilma Rousseff está experimentando na pele os efeitos do democratismo que se alastrou pelo país e corre o risco de ser vencida por ele, não obstante ter demonstrado a sua dignidade de indignação com o estado atual da corrupção política.
Parece que só isso não basta, ou tem-se uma autoridade carismática capaz de mobilizar a opinião pública, como a do presidente Lula, o que é suficiente para manter o controle (ou medo) dos maus políticos, ou cede-se a um jogo de interesses, em que o único perdedor é o povo brasileiro. Pois administrar honestamente parece que se tornou inviável em nosso país.
Numa análise como essa é comum se finalizar com uma prospecção otimista. Porém, não quero ser utópico, infelizmente não existe um remédio para isso a curto prazo, segundo a história enquanto o povo não sentir na carne os danos do que, consciente ou inconscientemente, ajudou a criar, ou melhor, elegeu, não haverá aquisição de cultura, não haverá o salto da evolução.