A corrupção endêmica no Brasil parece enfrentar um revés. Não é apenas a delação premiada, dando à luz episódios que não constituem surpresa, salvo pela dimensão do rombo. É a reação da cidadania, que encontrou um foco para a sua indignação.
Se as manifestações de 2013 foram difusas e pulverizadas, as recentes encontram convergência: o povo disse “Basta!”. Não há como conviver com o cambalacho, a maracutaia, a propina, o deboche, o acinte e a vergonha.
O Brasil poderia enfrentar todas as crises, mercê de um conjunto de circunstâncias favoráveis. Imensidão territorial de exuberante riqueza. Natureza pródiga. Recursos gratuitamente fornecidos a uma população que, educada, encontraria fórmulas de subsistência digna sem depender de um “Estado-babá” chamado a atender a todas as carências.
A irresponsabilidade e o despreparo conseguiram poluir as águas, o solo, a atmosfera e as mentes. Exercer a esperteza, querer levar vantagem, corromper, passou a ser algo ínsito ao “jeitinho” brasileiro. Mas o ponto de saturação chegou. A última gota extravasou. Já não há paciência para tolerar abusos. Chegou-se ao limite da tolerância.
A Justiça precisa ser serena, mas não está liberada de fornecer respostas oportunas. Seus ritos nem sempre – ou melhor, quase nunca – se compatibilizam com a urgência comunitária. Mas o processo foi deflagrado.
O importante agora é que a cidadania não esmoreça na sua indignação. E que não admita a continuidade de práticas imorais, tão entranhadas na vida pública. Não são apenas “tubarões” os que se aproveitaram de suas privilegiadas posições.
“Morder” o fornecedor, o empreiteiro, o empreendedor, o incorporador, é um esporte a que se dedicam também amadores. Os “peixes menores” parece não terem aprendido a lição. Tem-se notícia de que se aproximam de detentores de cargos e funções para exercer o seu deletério profissionalismo: exigir comissões em obras e serviços.
Não se permita que isso continue. A iniciativa privada tem condições de resgatar a confiança na economia, se dispensada de alimentar a cobiça de parasitas. Tolerância zero para estes. Não se avalia a imoralidade pelo valor da propina. O princípio da insignificância não pode ser invocado quando se cuida de restaurar a ética na vida pública desta sofrida Nação. Que os protestos sirvam ao menos de alerta para a arraia miúda, ainda desenvolta em suas nefastas praxes.