A INSÔNIA DE LULA

Nos governos tirânicos o governante, “ao pisar as leis da natureza, abusa da
liberdade dos governados, como se eles fossem escravos, e dos bens alheios
como dos seus” (Jean Bodin, Os Seis Livros da República). Já vimos de tudo
na vida política brasileira. O mais comum é o uso, pelos que operam o
Estado, das coisas públicas em proveito próprio. Tais grupos e indivíduos
cabem na definição do tirano formulada por Jean Bodin. Eles enriquecem às
expensas do erário porque são blindados por normas ilegítimas e perversas se
vistas sob o ângulo ético. Nada que discrepe dos juízos emitidos no Sermão
do Bom ladrão: “Se o alheio, que se tomou ou retém, se pode restituir, e não
se restitui, a penitência deste e dos outros pecados não é verdadeira
penitência, senão simulada e fingida, porque se não perdoa o pecado sem
restituir o roubado”. O ex-presidente Lula anda com insônia. Segundo
parlamentares próximos, o petista não consegue dormir desde a prisão, há
semanas de Marcelo Odebrecht, presidente da maior empreiteira do País, e do
executivo Alexandrino Alencar. Pela primeira vez, desde a eclosão da
Operação Lava Jato para investigar os desvios bilionários da maior estatal
brasileira, a Petrobras, Lula teme amargar o mesmo destino dos empreiteiros.
Até um mês atrás, o ex-presidente não esperava que sua história poderia lhe
reservar outra passagem pela cadeia. Em 1980, o então líder sindical foi
detido em casa pelo DOPS, a polícia política do regime militar e permaneceu
preso por 31 dias, chegando a dividir cela com 18 pessoas. Agora, o risco de
outra prisão, desta vez em tempos democráticos. A fúria pública recheada de
críticas ao governo Dilma Rousseff e petardos contra o partido idealizado,
fundado e tutelado por ele nos últimos 35 anos expôs, na semana passada,
como os recentes acontecimentos têm deixado Lula desesperado. A história é
cíclica, o poder corrompe e os lideres caem. A pouco, Fernando Henrique
Cardoso mencionou que em seus governos por vezes perdeu popularidade, mas
nunca o respeito do povo. No caso do Lula e do Partido dos Trabalhadores
perdeu-se o respeito e a popularidade. No caso de Lula, nada lembra o
estadista, hoje um homem abatido, ar de fracassado e há um instante de
prestar contas do que dizem que fez. Pode até provar sua inocência, mas já
foi condenado pela história, uma pena que tenha que ser assim, de fato o
poder corrompe.