AGRICULTORES, NÃO MISERÁVEIS

Em todos os setores da economia ocorre concentração da capital. Nos sistemas
financeiros, nos supermercados, nas farmácias, nos postos de gasolina, no
comércio varejista, por onde se olha, empresas se fundem, aumenta a escala
da produção, as vendas se agigantam. Poucos, aliás, combatem politicamente
esse transcurso cruel dos negócios urbanos, em que os grandes engolem os
pequenos. Parece normal na moderna economia. Na agropecuária, entretanto, a
rosa gira diferente. A agricultura familiar se fortalece juntamente com a
grande empresa rural. Mesmo assim, curiosamente, o discurso atrasado contra
o agronegócio teima em persistir, como se a mentira repetida se
transformasse em verdade. Os combatentes da moderna agropecuária, qual dom
Quixote, bradam contra moinhos de vento. De onde surge tal delírio
ideológico, conforme o denomina Zander Navaro? Certamente do equívoco,
elementar, que distingue “agricultura familiar” do “agronegócio”, como se
ambas as categorias fossem opostas, e não complementares. Ora, familiar não
significa ser miserável no campo, embora muita pobreza exista por lá. O
sucesso do programa de agricultura familiar reside exatamente na idéia de que, ao investir em tecnologia e ganhar produtividade, o pequeno produtor se
qualifica para participar do mundo do agronegócio. Assim procedem milhões de
antigos agricultores, todos querendo escapar da sofrida subsistência, ganhar
seu dinheiro, educar suas crianças, ter saúde, crescer na vida. Uma política
agrária moderna procura livrar o agricultor de sua submissão histórica,
emancipando-o econômica e culturalmente, transformando-o em pequeno
empresário. Agronegócio familiar. Quem, violentamente, combate o agronegócio
e, idilicamente, defende os agricultores familiares comete um pesado
conceitual. Milhões de excelentes produtores de café, soja, feijão, arroz,
leite, carne, mandioca, frutas, verduras dependem do agronegócio para viver.
Desejosos do progresso, buscaram financiamentos do Pronaf, aprimoraram-se
tecnicamente, organizaram-se em cooperativas, vendem com qualidade. Pequenos
na roça, gigantes no mercado. O discurso esquerdista que opõe o
agronegócio à agricultura familiar cheira a um populismo antigo, baseado
naquele desejo de tutelar a miséria rural, roubando dos camponeses pobres
seu próprio destino. Nada mais adequado à manipulação política do que tratar
os pequenos agricultores como coitados, cultivando sua dependência
histórica. Falsos líderes gostam da subserviência do povo, um terreno onde a
esquerda e a direita autoritárias de confundem facilmente.