Uma das questões tormentosas para todas as democracias é a forma de recrutamento de juízes, promotores de Justiça, defensores públicos e demais carreiras jurídicas. Em tese, o modelo brasileiro é incensurável.
Nossos juízes, promotores, defensores públicos, procuradores, delegados de polícia e de legatários dos serviços extrajudiciais – os antigos cartórios – são selecionados por concurso de provas e títulos. Fórmula que alia o aspecto democrático – todos podem concorrer, desde que bacharéis em Direito – e a feição meritocrática – só os mais capazes serão aprovados.
Todavia, persiste o tema da legitimidade, muito debatido em outros países, a merecer uma resposta consistente e convincente. Os demais poderes têm seus integrantes eleitos. Submetem-se ao escrutínio popular. Isso é próprio ao regime democrático. Tanto que os Estados Unidos têm vários estados que elegem seus juízes, para responder a esse déficit de legitimidade muito comentado na doutrina.
Aqui, o concurso público de provas e títulos não atende a esse requisito de escolha popular e merece críticas. A resposta mais comum é a de que o juiz atende ao princípio da legitimidade mediante sólida fundamentação das decisões.
Como profere suas deliberações por escrito ou oralmente, mas com toda a publicidade e transparência, tal procedimento adquire a legitimidade que vem do consentimento da população à qual está preordenado a servir. Superada a questão da legitimidade, outra ordem de reflexões ainda não mereceu definitiva solução. O concurso público escolhe, na verdade, os mais capazes?
É algo irrespondível. Tem sido assim e as carreiras públicas não padecem de falta de preparo técnico. Isso é suficiente para o excelente desempenho da função estatal?
Ocorre que a seleção de profissionais das carreiras jurídicas ainda ostenta um déficit sobre o qual existe relativo consenso: avalia-se a capacidade de memorização, na expectativa de que o candidato decore todo o acervo legislativo, doutrinário e jurisprudencial produzido a respeito do universo jurídico.
Nem sempre isso equivale a equilíbrio, sensibilidade, capacidade de trabalho, compreensão, solidariedade, humanismo e, principalmente, bom senso. Mas quem é que pensa em alterar esse quadro?
Fonte: Jornal de Jundiaí | Data: 19/11/2017
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo