FALTA VERGONHA NA CARA

Uma das vantagens da falta de vergonha na cara de alguns políticos, é que
rende muito assunto para colunas de jornal, rodinhas, botecos etc. Já quanto
o caso da moral em concordata dos mesmos, é que ela é temporária e pode
evitar a falência definitiva. Trata-se de uma flexibilização de
comportamento destinada a adaptá-los a valores mais pragmáticos. Por
exemplo, por que o exagero de se falar em crime eleitoral, se dá para
julgá-lo simplesmente por caixa dois? Por que empregar a terrível palavra
“roubo” para descrever a mera utilização de recursos não contabilizados?
Qual a diferença entre enviar recursos por transferências interbancárias ou
por meio de dólares na cueca? Conforme os institutos de pesquisa 58% da
população brasileira se preocupa com o desemprego, 57%, com a violência e
38% com a saúde, apenas 7% se revelam preocupados com a falta de ética e
moralidade. Emprego despudorado do dinheiro dos contribuintes em campanhas
não confessas, ratazanas devoradoras do erário por meio das mais
diversificadas maracutaias, licitações fraudulentas, propina … Quem está
preocupado com tudo isso? Apenas 7% dos eleitores. Então, por que dar tanta
importância a isso? É verdade que certa geração poderá acostumar-se, mais do
que o desejável, com certas facilidades na dura luta pela vida. Mas uma
propinazinha aqui, um dinheirinho por baixo do pano ali, um subornozinho
discreto, uma falsificaçãozinha que ninguém percebe acolá – sem ser coisa
exagerada, que prejudique muito os outros – não poderão melhorar a vida de
tanta gente? Se tantas pessoas na vida política têm sido extremamente bem
sucedidas, cometendo seus delitos (quer dizer, erros, equívocos), mas sendo
devidamente absolvidas (perdoadas) por seus companheiros de labuta, por que
não ter a humildade de fazer igual, de seguir seus métodos de sucesso? Já
diz o velho ditado popular: “Feio é roubar e não conseguir carregar”. O que
melhor temos absorvido, na observação da vida política brasileira nos
últimos tempos, é o pleno êxito produzido pela pura e enfática negação de
responsabilidades, mesmo que isso represente um violento atentado à lógica,
à clareza dos indícios, à evidência da ocorrência, à realidade dos fatos.
Enfim, essa “falta de vergonha na cara” ensinará a longo prazo, a sociedade
brasileira a não ter medo de ser feliz, ante a flexibilização de sua
consciência.