O que governa o mundo?

Para grande parte dos pensadores, o interesse é que governa o mundo. Mas há quem não pense assim. Shaftesbury, por exemplo, acredita que uma observação atenta descobrirá que paixão, humor, capricho, zelo, sectarismo e mil outras peças têm parte igualmente considerável nos movimentos do mecanismo.

Todas as ações da vontade têm causas particulares. Como identificá-las? A filosofia kantiana se baseava na convicção de que as ações humanas provinham de ponderação ética. A razão seria o instrumento de aferição entre os diversos sentimentos colidentes.

Já os chamados “filósofos da suspeita”, na linguagem de Luc Ferry, dentre os quais Nietzsche e Freud, adotam como princípio de análise o pressentimento de que, por trás das crenças tradicionais, que se pretendem nobres, puras e transcendentes, há sempre interesses escusos, escolhas inconscientes, verdades mais profundas e frequentemente inconfessáveis.

Na verdade, o ser humano só age por paixão. A razão seria escrava desse intenso sentimento que faz a roda do mundo girar. É o que se extrai de Rousseau, ao detectar que a vida em sociedade é o registro da busca de prover o necessário e então o supérfluo.

Em seguida vêm as delícias, depois a riqueza, os súditos, os escravos. Não há um momento de descanso. Quanto menos naturais e prementes as necessidades, mais aumentam as paixões e a vontade de satisfazê-las. Como se domestica uma paixão? Para Agostinho e Calvino, o Estado é o repressor das paixões. Mas como cumprir sua missão, se o governante é também movido por paixões? Reprimir paixões parte do pressuposto de que a ética se sobreponha aos impulsos. Por isso é que o Estado é impotente para reprimir os instintos, as paixões e os desvarios.

A alternativa é acreditar que a sociedade possa atuar como agente de transformação, como veículo civilizador, em lugar de ator da repressão. É por isso que a educação se torna o motor da conversão de uma coletividade movida por paixões, em uma sociedade que saiba se sacrificar para que o bem comum, o interesse coletivo ou a vontade da maioria seja respeitada.

Essa a crença que legitima a continuidade das políticas públicas: a fé, nem sempre inabalável, de que a sensatez prevaleça e afaste o descontrole, do qual só poderá resultar prejuízo para todos.

Fonte: Jornal de Jundiaí | Data: 26/05/2016
JOSÉ RENATO NALINI é secretário da Educação do Estado de São Paulo. E-mail:imprensanalini@gmail.com.