Judicialização na Política Brasileira

Muitos artigos têm sido escritos, como também alardeados na mídia sobre a judicialização do processo político brasileiro, cujos autores são políticos, especialistas em Ciências Sociais ou mesmo juristas. Em outras palavras, que nossa política esteja subserviente ao Supremo Tribunal Federal (STF), seja pela incapacidade do Legislativo em aprovar leis constitucionalmente corretas, seja pelo ardil de consultar a Suprema Corte como estratégia do jogo político.

Tive a grata satisfação de ler recentemente o livro, recém-lançado, “Judicialização ou Representação? – Política, direito e democracia no Brasil”, de Thamy Pogrebinschi, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Trata-se de um estudo escrupulosamente científico e sério sobre o tema, e com uma base de dados e observações estatísticas convincentes.

A princípio coloca que o fundamento usado para basear a tese de jucialização da política no Brasil é o número de ações ajuizadas quanto à constitucionalidade, e apresenta todos os dados a respeito, no período de 21 anos, de 1988, quando da inauguração da nova Carta Magna, a 2009.

Considera então as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) e as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) basicamente, e também as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) que são em menor número.

É muito interessante acompanhar as demonstrações estatísticas, que falam por si mesmas, por exemplo, o STF julgou procedente 13,32% das ADIs e ADPFs que buscavam impugnar normas. O que corresponde a 67 decisões do STF, as quais resultaram na contestação de 47 normas do Congresso Nacional, e apenas 3 foram declaradas integralmente inconstitucionais. Tais números mostram que o STF invalidou menos de 0,02% das 12.749 normas promulgadas pelas Casas do Legislativo Federal de 1988 a 2009!

Apresenta uma riqueza de dados, analisados sob vários ângulos, o que desautoriza, pelas evidências, qualquer alusão à judicialização de nossa política.

E, alguns dados interessantes como as ADIs e ADPFs julgadas procedentes ou procedentes em parte pelo STF, relativamente aos governos de 1988 a 2009: Lula: 36,55%; FHC: 18,27%; Collor: 6,9% e Itamar: 6,9%.

E no último capítulo trata do tema “A Representação Política” (ou seja, a forma como os parlamentares são escolhidos e representam o povo) de uma maneira deliciosa; para os menos avisados pode parecer a busca de um final politicamente correto, mas na verdade está seguindo estritamente o método científico, consubstanciando várias afirmações, ao mesmo tempo que  chama em seu auxílio o pesquisador Bernard Manin.

Porém, para quem lê, inserido no cenário político brasileiro hodierno, é impossível impedir que venha à mente certas considerações e comparações relativas às turbulências, intempéries e desencontros pelos quais passa nosso Congresso, afligido por uma epidemia galopante de corrupção.

Impossível também impedir a ilação de um sofisma: a suposição que a escolha da representação política advém de um direito fundamental da pessoa, como à vida, à liberdade, à subsistência, etc., como é profusamente difundida pelos governos populistas.

Muito pelo contrário, na democracia legítima e compatível com o século XXI, a escolha da representatividade política necessita de algo mais: da plena capacidade para o exercício da cidadania, que não pode prescindir da instrução, cultura e liberdade, inclusive para não participar de tal escolha!

1 comentário

  1. armando morelli

    Perfeita a conclusão! Nossa ‘democracia’ tem servido muito melhor a quem ‘representa’ do que aos ‘representados’…
    O título de eleitor obrigatório é um ótimo exemplo desse paradoxo!

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