Não volte ao passado

Embora saiba que prevalece hoje a concepção de que só temos o presente, pois não podemos alterar o passado e o futuro é incerto, prendo-me às boas recordações. Por isso teimo em revisitar lugares dos quais guardo saudade.

 

Estes dias, em visita correcional a Santo André, teimei passar pela travessa João Rodrigues, onde moravam, na casa 41, meus tios Lydia Nalini e Júlio Dbaly. Não tinham filhos e levavam os sobrinhos a passar férias com eles. Ao lado, verdadeira chácara, cheia de árvores e com uma grande mansão em estilo alemão, onde morava uma loirinha chamada Mônica. 

Tudo era bucólico. Para ir à Igreja São José Operário, em missas diárias, caminhava-se por um prado despovoado. E o que encontrei hoje? A casa ainda existe, mas não é a mesma. O jardim e as rosas desapareceram. A chácara cedeu lugar a um conjunto de prédios. Tudo construído. Resta-me percorrer os jardins da memória, que só a mim pertencem, como dizia a sábia Cecília Meireles. 

Assim é que também lamento a destruição da residência Generoso Mário Bocchino, esquina da Rangel com Padroeira e que fora antiga sede do Tênis Clube. E a casa de Adelina e Manoelito Garcia, com sua verdadeira floresta interna. E a casa de Salim Gebran, heráldica e nobre, na rua Barão de Jundiaí. E tanta coisa mais que deixou de existir e que fez do centro da cidade um conjunto de construções esteticamente discutíveis, para dizer o mínimo. 

Cidade que surgiu em 1615, segundo a melhor tradição e que só conseguiu preservar, a duras penas, o Solar do Barão de Jundiaí. Havia a Escola Normal com suas palmeiras imperiais. O solar de Irma e Hermes Traldi e um grande jardim. O Mosteiro de Sant´Ana, que chamamos São Bento, era ladeado por um verdadeiro bosque. O Parque Infantil Prefeito Manoel Aníbal Marcondes deu lugar a uma rodoviária. E por aí vai… 

Quem não preserva o passado perde referências. Sem a tradição e a âncora da memória, o futuro perambula. Quem não respeita o passado sequer sabe para onde focar o farol do porvir. Mas isso é conversa que a ambição e a cupidez não conseguem ouvir. Vamos continuar demolindo e descaracterizando a fisionomia urbana. Afinal, é isso o que chamam progresso!