Parece incrível

Uma cidade como São Paulo já produziu Brecheret e Volpi, Tarsila e Rebolo, Lothar Charroux e Gustavo Rosa. Fez florescer Lina Bo Bardi, Villanova Artigas, Jean Maitrejean, Paulo Mendes da Rocha, Ariosto Mila, Pedro Taddei, José Artêmio Brito Cruz. Todos artistas consagrados, mera amostragem da qualidade notável do que se pode concretizar em termos de artes plásticas e arquitetura.

No campo do bom gosto, a prodigalidade nos brindou com Costanza Pascolato, Cláudia Matarazzo, Glória Kalil e a criatividade de Nisan Guanaes, Washington Oliveto, Zaragoza, Petit e Duailibi, dentre tantos outros.

A ética não deixa de ser uma estética d‘alma e temos paradigmas como Celso Lafer, Fábio Konder Comparato, Tércio Sampaio Ferraz, Miguel Reale Júnior, José Eduardo Campos de Oliveira Faria, cuja atuação como educadores da deontologia orgulhariam qualquer País de Primeiro Mundo.

Como é que esta cidade que no seu quarto centenário inaugurou o Parque Ibirapuera, que tem os mais notáveis institutos de pesquisa e cultura, que sedia a USP, que tem a Fapesp, convive com a degradação de um centro urbano que desde há muito ostenta obras-primas? Ou não são dignas de visitação e de orgulho a Sé, o Teatro Municipal, o edifício Alexandre Mackenzie, o Memorial da América Latina, o Museu Paulista do Ipiranga, a Oca do Parque e tantos outros tesouros?

Onde foi parar a nossa capacidade de indignação, que não bradamos contra a degradação do centro, a ocupação de todos os espaços por seres humanos que merecem cuidado, mas que não podem exercer o direito de se utilizar, com exclusividade, daquilo que é de uso comum para todos?

Perdemos a capacidade de enxergar que o rei não está apenas nu, mas que está deteriorado, putrefazendo-se, exibindo chagas da pichação, da sujeira, do acinte a qualquer estágio civilizatório? Não podemos nos acostumar com o lixo, a sujeira, o descaso. Reajamos, inteligência paulista! Não entreguemos nossa cidade ao abandono, ao vandalismo, à imundície que reflete o estágio miserável de nossa República.

Conviver com tal quadro, como se fora natural, é conivência, cumplicidade e coautoria no crime contra o ambiente e contra a História que faz São Paulo naufragar no retrocesso.