Esse mês marca o 20º. aniversário da Guerra da Bósnia, um dos mais sangrento e desumano conflito armado de nossa época.
Com a desintegração da antiga Iugoslávia após a Guerra Fria, e o desmoronamento da Cortina de Ferro, formada por vários países do regime comunista, comandados pela ex-União Soviética, as nações dos Balcãs foram as que mais sofreram com as crises sócio-políticas.
Uma série de fatores políticos, religiosos, nacionalistas e crises econômicas foram responsáveis pelo desencadeamento de um tsunami de ódio, ressentimentos tribais e religiosos, interesses políticos e econômicos guardados por muito tempo, no âmago de pessoas que eram, antes de mais nada, irmãs; porém divididas entre muçulmanos, cristãos-ortodoxos e católicos-romanos.
Os sérvios invadiram a Bósnia-Herzegovina dando início ao conflito, que rapidamente se generalizou e internacionalizou-se, custando a vida de aproximadamente 200 mil pessoas e 1,8 milhões de desalojados.
Dentre as inúmeras atrocidades, que os jornais na época registravam todos os dias, um fato chocou e maculou o mundo de forma indelével, que ficou conhecido como “Romeu e Julieta de Sarajevo”.
Lembro-me perfeitamente o que senti quando tomei conhecimento da notícia, e posteriormente quando li os detalhes em uma reportagem da revista Veja, na sala de espera de um consultório odontológico.
Em matéria dessa semana a cnn.com lembra esse episódio. Bosko era sérvio e Admira muçulmana. Ambos namoravam desde a juventude, antes da guerra.
Com a cidade de Sarajevo sitiada e a incerteza que continuariam vivos, tentaram escapar atravessado a única passagem viável, a Ponte Vrbanja, mas foram baleados e morreram abraçados um ao outro.
Eles continuaram no chão e abraçados por oito dias, pois ninguém foi capaz de resgatar seus corpos com segurança.
Bosko e Admira ficaram juntos por nove anos, quando foram mortos em 18 de maio de 1993, ambos com 25 anos. Porém, hoje continuam juntos da mesma forma, abraçados, pois foram enterrados em um cemitério em Sarajevo, na mesma posição que morreram. Um símbolo que desafia o ódio da guerra e a irracionalidade do preconceito étnico. Suas famílias se uniram em uma grande amizade e lembraram juntas, há poucos dias, a dor que sentem há quase 20 anos.
Histórias como essa, que não são filmes, mas a nua realidade humana, me traz à mente o saudoso cientista Stephen Jay Gould, uma das melhores cabeças que a ciência americana produziu até hoje: irreverente, satírico e inconformista.
“Aquele que se regozija com a diversidade da natureza e se sente ensinado por cada animal, tende a considerar o Homo sapiens como a maior catástrofe desde a extinção cretácea.”