Caveat emptor

A expressão latina ‘caveat emptor’  (“tenha cuidado, comprador”) se trata de um alerta ao consumidor de que ele está por sua conta e risco nas suas relações comerciais.
 
Em outras palavras, “veja bem o que você vai fazer” antes de ceder àquele impulso irresistível de se entregar, com brilhantes olhos arregalados, quando está à caça de  algo que precisa – ou não, eis que necessidade é algo maleável, que se molda fácilmente a qualquer vontade súbita! – comprar …  
 
Até há pouco tempo atrás, a percepção e a avaliação do interesse do comprador dependia mais da habilidade do vendedor – ‘pessoa física’ também – num jogo tête-à-tête entre iguais, intentando o melhor negócio.
(As feiras das manhãs de sábado, então – que se as mantenha, pelo menos no Brasil! –  pra um ‘baby boomer’ tupiniquim como eu, são o êxtase!).
 
Agora, com o advento da Internet, comprar ficou menos pessoal, mas bem mais prático, se não mais fácil.
‘Surfar’ entre as ofertas, comparar produtos e serviços – e os seus preços – hoje qualquer ‘mouse’ pode fazer.
 
Logo, os preços deveriam cair, ou, no mínimo, serem iguais, certo? Não necessariamente…
 
O vendedor ‘online’ já tem à sua disposição programas que ajudam a identificar o cliente endinheirado – ou o mais perdulário – e, assim, cobrar mais pelo que ele procura, ou seja, “personalizar” o preço conforme o perfil decorrente do comportamento cibernético do comprador-surfista.  
 
O comprador ‘online’ deixa escapar muita informação que pode ser aproveitada:
 
‘Cookies’ revelam os ‘sites’ que ele visita e permitem vislumbrar faixa de renda, idade e sexo.
O endereço na Internet pode ser associado com o endereço físico, e, quanto mais “nobre” a vizinhança, maior deve ser o bolso do comprador.
Usuários de computadores Apple-Mac têm, em geral, maior poder aquisitivo do que os que usam PC-Windows, e as empresas podem oferecer aos primeiros opções mais caras, como a Orbitz (‘website’ de viagens) já faz.
O ‘mouse’ – esse rato! – também revela muita coisa: clicar muito rapidamente da ‘home page’ pro produto e em seguida pro ‘check-out’ mostra que a compra já está decidida – pra que, então, oferecer um desconto que não foi pedido?
 
Munidos desses novos programas, os varejistas parecem fazer uso cada vez maior de tais informações pra discriminar consumidores.
À medida que a definição do preço fica mais complexa e variável, e, portanto, mais difícil de avaliar por parte do comprador – caso de produtos como seguros, viagens aéreas, planos de celulares e hotéis, por exemplo – tal prática se torna mais comum.
 
Em resumo, oferece-se o mais barato (ou o desconto) a quem pedir (ou, indeciso, vacilar, parecendo pedir); aos demais, porque são ricos, ou porque são rápidos, ou porque sabem o que querem, ou porque não gostam de pedir, a “tabela cheia” do mais chique…
 
A discriminação via preço não é nenhuma novidade.
 
Em 2006 uma pesquisa no mercado de peixes ‘Fulton’ de Nova Iorque mostrou que dos asiáticos se cobrava muito menos que dos demais fregueses, porque se sabia que aqueles desistiam de comprar mais facilmente que estes, se os preços fossem altos demais – e eram muito melhores em se agrupar e boicotar o barraqueiro ganancioso!
 
Evidentemente, ninguém gosta de pagar mais pela mesma coisa, e freguês insatisfeito deixa de comprar, o que faz tal prática ser arriscada em todos os sentidos de negócio.
 
A Amazon descobriu isso em 2000, quando tentou vender DVD a preços que variavam conforme o navegador utilizado pelo comprador: uma reação pública forçou a empresa a dar algum tipo de compensação ao cliente que pagou mais caro.
 
Por outro lado, pode-se alegar que a ‘personalização de preço’ – no que eu, consumidor concupiscente, me recuso a acordar, seja no gênero, no número, no grau ou na orientação sexual! – envolve a anuência de quem compra, que é informado do preço, embora não saiba que o seu é maior…
 
Em todo caso, enquanto esperamos a Apple lançar ‘apps’ que nos permitam o contra-ataque e consigamos apagar a trilha de ‘clicks’ do ‘mouse’ – sempre ele, esse rato! – recomenda a prudência que evitemos parecer ricos, mesmo que o fôssemos:
 
– Ter um PC Windows sempre à mão;
– Começar ‘surfando’ num ‘site’ de comparação de preços;
– Livrar-se dos ‘cookies’ que só deixam trilhas;
– Uma vez no ‘site’ que interessa – calma, não tanto assim! – fingir que procura barganha, como se fosse um ‘picker’ no ‘Good Will’;
– Depois de finalmente ter se decidido, vá pelo caminho mais longo possível à página do ‘check-out’.
 
A Internet pode ter tornado mais fácil pro varejista fazer discriminação via preço diferenciado, mas mesmo na loja ‘online’, assim como na de alvenaria, ainda é prerrogativa do comprador sacar o cartão de crédito…
 
Bem lentamente!
 
 
Fonte: The Economist
 
 
 
 
 

1 comentário

  1. Miriam Deborah Barreto

    Muito bom!! Agora sei porque sempre consigo bons descontos.rsrsrs. Compartilhei.

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