Faulkner & Feliciano

Provinciano, inculto e servil à matriz, o brasileiro típico não cultiva os seus talentos. Mas curva-se, com a coluna cervical mais complacente que se conhece, perante os talentos alienígenas. Assim é que não faltam comemorações para rememorar “datas redondas”, se o destinatário da homenagem for um estrangeiro. Já para os tupiniquins, nada como o bom esquecimento. Dois exemplos, sem críticas, pois é óbvio que o americano William Faulkner – 1897-1962 – merece viver para sempre.

Este ano se celebra o cinquentenário de sua morte. E é como se ele nunca tivesse partido, diz Vinicius Jatobá. Com razão. Quem escreveu “Luz em Agosto”-1932, “O Som e a Fúria”-1929, “Absalão-Absalão”-1936, “O Intruso”-1948, “Os Invictos”-1962 entre outros, marcou seu nome na literatura universal. Com razão, foi o Prêmio Nobel de 1949. Rubens Scavone o conheceu pessoalmente, quando esteve em São Paulo e foi recebido por Maria de Lourdes Teixeira e José Geraldo Vieira.

Modestamente, mas também digno de ser lembrado, o jundiaiense José Feliciano de Oliveira também morreu em 1962. Estive em seu enterro. Impressionou-me o homem elegante, de barbas brancas, um monóculo de lentes azuis, como a repousar na urna. Quem poderia imaginar que em 2003 eu ocuparia a mesma cadeira que ele titularizou como imortal da Academia Paulista de Letras?

O mais erudito dos jundiaienses, o mais parisiense dentre os eruditos brasileiros, o autor de ensaios, de projetos de salvação nacional pela educação – já àquele tempo! – o astrônomo que construiu uma torre para melhor observar os astros em sua casa na rua da Consolação, é hoje nome e tutelar de um estabelecimento de ensino em sua terra natal.

Por que não as “Semanas José Feliciano de Oliveira” para homenageá-lo como se deve? Por que não mostrar à mocidade brasileira que no início do século XX já se destacava um patrício que, por lecionar na Sorbonne, evidenciava que também dos trópicos podia sair uma fulgurante inteligência e um talento invulgar?

O mea culpa cabe também à Academia Paulista de Letras, que ainda não homenageou o seu fundador, tão modesto que se recusou a aceitar o convite de J.J. de Carvalho, o médico a quem cabe a glória de haver criado a Casa de Cultura Paulista do Largo do Arouche. Só aceitou integrar o sodalício porque J.J. de Carvalho insistiu muito e, mesmo assim, afirmava pretender ser sempre “o último” dentre os acadêmicos.