Nada mais frustrante do que rever fotos de São Paulo antiga, comparando-as com a realidade contemporânea. O centro da Capital dispõe de edifícios nobres, elaborados com estilo, fruto da excelência do trabalho de artesãos europeus que capricharam na ornamentação de prédios inspirados na renovação de Paris. Hoje, a maioria está imunda, pichada, ocupada por invasores, com seres humanos dormindo sobre os passeios, a qualquer hora do dia.
A sujeira é permanente. A sensação de insegurança fornece um cenário de “Blade Runner” dos pobres. Não é a cidade ianque do futuro, assustadora e desumana. É a contaminação de todos os espaços pela metástase do apodrecimento físico e moral. Os furtos acontecem e integram a rotina. O lixo se amontoa. Nada consegue preservar a dignidade no centro abandonado: monumentos relegados à própria sorte, templos maculados por signos da insensatez, paredes toscas erguendo-se nas antigas portas de acesso, para que a invasão não continue.
Quem invade alega direito à moradia. Mas esse bem da vida fundamental está sendo administrado pelo governo. Tanto o Estado como o Município elaboram cadastros, procuram entregar residências àqueles que atenderam a requisitos mínimos. O invasor não segue a cronologia. Cria um direito “fora da fila”, desrespeita o antigo pretendente, não quer saber de observância mínima de um protocolo que ordena o atendimento na medida das possibilidades.
Quando se compara a paisagem urbana paulistana de algumas décadas, notadamente aquelas do início do século passado, cotejada com o quadro atual, o primeiro sentimento é o de vergonha. Não soubemos cuidar de nossa cidade. Ela ficou invadida pela falta de senso, pela falta de cuidado, pela falta de respeito e, enfim, pela falta de amor.
Que lição estamos a ministrar às novas gerações? O que foi feito de um passado em que ética e estética não eram antônimos, mas refletiam uma civilização nascente? Como foi que nos degradamos? O pior de tudo é que a maior parte de nós convive com essa miséria ambiental sem se dar conta dela. Acostumamo-nos com tudo. Até com o fundo do poço.