O público da repartição (Parte 1)

 

Dado o grande número de brasileiros residentes – ou só presentes – no estado da Flórida, o Consulado do Brasil em Miami, diante do assédio em seus guichês impenetráveis de controversa produtividade, também pratica o chamado Programa de Consulados Itinerantes.

 

I[]mplantado pelo Itamaraty em consequência do decreto relativo ao Programa de Desburocratização do Governo Militar (*), tal itinerância foi um dos projetos vencedores do 3o. Concurso de Inovações da Gestão Pública (prêmio “Hélio Beltrão” – aquele nosso heróico ministro da desburocratização), em 1998.

 

Tratam-se de deslocamentos de alguns funcionários consulares para cidades nas quais se concentram mais brasileiros, onde, com a ajuda de dezenas de voluntários vestidos com camisetas do Banco do Brasil – muito bem intencionados e muito mal treinados no programa e no idioma “portuglish” – se procura dar atendimento direto ao requerente.

 

Em outras palavras, ir aonde o povo está.

 

São realizados aos sábados e domingos, geralmente em igrejas, que trocam o espaço físico precário pelo potencial aumento do rebanho, em clima de festa paroquial, com ênfase folclórica na legítima feijoada acompanhada pelo guaraná – pantomima patética e incompleta, eis que faltam o pastel e a garapa daquela antiga pastelaria do chinês e a caipirinha, nossa melhor garota-propaganda…

 

À exceção dos sotaques eventuais e do pagamento – sempre antecipado e só possível através de money order do correio americano – nada mais lembra o desenvolvido país anfitrião, e sim o “bullying public service” da distante e pobre terra tupiniquim.

 

O Consulado do Brasil – extrato concentrado da pátria-mãe! – parece imune a qualquer influência do meio emprestado; o referencial é só o que convém à estupidez cega, surda e autoritária do que se traveste de rei e se aproveita do desequilíbrio circunstancial de forças e de carências.

 

Ao contrário de servir aos seus conterrâneos que o sustentam, resume o que há de pior nas demais repartições públicas que representa: o desrespeito crônico ao outro lado do guichê…

 

(*) O Programa de Desburocratização do Governo Militar, instituído pelo Decreto nº 83.740, de 18 de julho de 1979, era ousado e previa a melhoria do atendimento dos usuários do serviço público; reduzir a interferência do Governo na atividade do cidadão e do empresário e abreviar a solução dos casos em que essa interferência é necessária, mediante a descentralização das decisões, a simplificação do trabalho administrativo e a eliminação de formalidades e exigências cujo custo econômico ou social seja superior ao risco. Designado Ministro para aplicar o programa, Beltrão adotou várias medidas desburocratizantes e algumas, como o Estatuto da Microempresa e os Juizados de Pequenas Causas (mais tarde transformados nos atuais Juizados Especiais), perduram até hoje.[]

Mas a partir da década de 90, o programa começa a ser abandonado e com o fim do ciclo militar e da extinção do próprio Ministério, bem como a revogação do decreto, em 2004, ocorreu um retrocesso e várias das medidas desburocratizantes não saíram do papel. (Fonte: Wikipédia)